Sindicato dos Aeroviários no Estado de São Paulo
Sexta, 04 de Outubro de 2024

Milhas aéreas são usadas até para pagar luz e água

09/11/2015

O aperto nas contas deste ano, com alta da inflação e queda dos rendimentos, faz o brasileiro lançar o olhar sobre formas de consumir sem pôr a mão no bolso. Desprezados por longo tempo, os programas de milhas aéreas voltaram a ganhar adeptos, que, sem gastar um tostão, aproveitam para viajar e obter outros produtos ofertados nessas promoções. A principal forma de uso ainda é associada às passagens aéreas, mas é possível usar os pontos para abastecer o carro, fazer compras em supermercado e até pagar luz e água.

Os dois maiores programas de milhas de companhias aéreas (Multiplus e Smiles) registraram crescimento superior a dois dígitos do resgate de pontos no primeiro semestre. O aumento se dá sob forte impulso de outros produtos que não as passagens aéreas. No caso do Smiles, a emissão de bilhetes teve alta de 15% ante igual período do ano passado, enquanto a obtenção de produtos cresceu 188%. Já na Multiplus, a demanda aumentou 9,8% para bilhetes e 13,8% para a média geral. “Os participantes estão cada vez mais dando valor aos pontos. A troca de itens, como passagens aéreas, produtos e serviços, por pontos está cada vez mais passando a fazer parte do dia a dia desse consumidor”, afirma a gerente de Marketing e E-commerce da Multiplus, Carolina Torres. No programa, é possível trocar os pontos por mais de 550 mil itens, que vão de produtos eletrônicos, artigos esportivos e brinquedos a vinhos e mensalidades de academia.

Sempre atento às promoções dos programas de milhas, o piloto de helicópteros Sebastian Amaral adquiriu 100 mil milhas por R$ 2,8 mil. Com o pacote, conseguiu comprar passagens de ida e volta para 15 viagens entre Belo Horizonte e Curitiba entre agosto e dezembro para visitar a namorada. E ainda sobrou um pouco. Em média, cada trecho saiu por R$ 93 (fora o valor da tarifa aeroportuária). Entre as estratégias traçadas por ele para acumular milhas, além de participar de clubes de milhas, está o uso sistemático do cartão de crédito para o pagamento de contas. “Pago tudo no crédito para juntar milhas”, diz ele. Outra saída para economizar é planejar com antecedência as viagens.

“Nesse momento de incerteza econômica, é um estímulo bom não precisar pôr a mão no bolso”, afirma o diretor do Tudo Azul, Alex Malfitani. Segundo ele, o programa de milhas da companhia Azul tem ganhado impulso nos últimos meses, favorecendo o aumento do resgate de pontos. Por outro lado, a empresa tem feito promoções para divulgar o programa, o que incentiva o usuário a gastar as milhas. “São muitas promoções para o cliente não deixar parado na conta”, afirma Malfitani. Entre as facilidades disponíveis estão a possibilidade de comprar milhas para inteirar a compra de passagem e a renovação e transferência de pontos.

Apesar de os programas de milhas estarem bastante associados às empresas aéreas no Brasil, outros formatos são criados, ampliando assim os possíveis usos. A “moeda” Dotz é um deles. Da mesma forma que os cartões de crédito e as milhas aéreas, trata-se de bônus recebido pelo cliente ao pagar uma conta em parceiros da empresa. A cada R$ 2 gastos recebe-se 1 Dotz. O valor acumulado pode ser trocado por itens variados. Com 3 mil Dotz, por exemplo, é possível abastecer R$ 30 em postos parceiros; ou mesmo ir a um jogo no Mineirão a partir de 2 mil.

Atenção redobrada Segundo o gerente regional da empresa em Belo Horizonte, Leonardo Pimenta, a curva de expiração de pontos mostra queda, ou seja os clientes estão cada vez mais atentos ao prazo limite para uso dos pontos. Ele indica dois números que demonstram o aumento do uso da moeda: o volume acumulado ao longo do ano cresceu 60%, enquanto as trocas tiveram alta de 135% no mesmo período. “A pessoa vê: 'opa, ano de crise. Está na hora de eu gastar meus Dotz'”, afirma Pimenta. E acrescenta: “Qualquer forma de dinheiro é dinheiro, seja reais ou milhas”, afirma.

No Brasil, os programas de fidelidade ainda atingem apenas 8% da população, ao passo que no Reino Unido alcançam 25% e no Canadá, 18%, afirma a gerente de Marketing e E-commerce da Multiplus, Carolina Torres. Com isso, ela vislumbra possibilidade para expansão. “No primeiro semestre, a taxa de pontos não utilizada da Multiplus foi de 17,9%, ante 18% no primeiro semestre de 2014. Esses dados mostram que existem casos de pontos expirados por falta de atenção ou mesmo falta de costume na utilização deles”, afirma.

Surge um novo comércio

Os acumuladores de milhas têm outra possibilidade, bastante adotada, de negociá-las em sites especializados. Em lugar de emitir bilhetes com os pontos, o cliente de programas de companhias aéreas pode vendê-los para essas empresas. Segundo o executivo e cofundador do MaxMilhas, Max Oliveira, a demanda tem crescido devido à maior atenção do brasileiro em relação às milhas. Tempos atrás, milhões de pontos expiravam sem ter sido usados pelos clientes, para deleite das empresas.

No atual cenário, muitos brasileiros que planejavam viajar para o exterior no fim do ano desistiram por causa da cotação do dólar. Em troca, diz Oliveira, “prefere vender as milhas” para dar outra destinação aos pontos acumulados. Por efeito da desvalorização do real, o acúmulo de pontos leva mais tempo. Isso porque a pontuação é atrelada ao dólar. Com isso, em vez de gastar R$ 2 para ter uma milha, passa a ser necessário que o usuário disponha de R$ 4.

O presidente do Smiles, Leonel Andrade, reforça a avaliação sobre os efeitos do dólar. Segundo ele, 12 companhias aéreas estrangeiras foram incorporadas ao programa, antes focado apenas na Gol, mas o crescimento na procura por passagens internacionais ainda é inferior ao patamar projetado. No primeiro semestre, 72% dos produtos emitidos foram tíquetes para voos domésticos, 21% para internacionais e 7% para produtos que excluem as passagens. “Para os internacionais a demanda seria maior não fosse o dólar. Seria superior a 30%”, diz. Uma ressalva deve ser feita no caso da Azul. Apesar de o uso absoluto dos pontos ser maior nos voos domésticos, o percentual de uso de milhas em voos internacionais é superior.

Na avaliação de Andrade, o cenário econômico adverso não contribui para o setor, mas, associado ao novo status adquirido pelos programas de milhas nos últimos três anos, o uso dos pontos mostra-se uma alternativa. “[As pessoas] estão mais preocupadas em não gastar [dinheiro]. Por que não usar as milhas?”, afirma o presidente do Smiles.

Vantagens

As companhias aéreas Iberia e British Airways lançaram no Brasil o On Business, programa de vantagens voltado para pequenas e médias empresas. Na compra de passagens de ambas as companhias, os usuários cadastrados no programa ganham pontos, que podem ser trocados por novos bilhetes, obter descontos de 5% a 10% nas viagens seguintes ou dar direito a acomodações luxuosas. Além dos pontos acumulados no On Business pela empresa, os passageiros ainda adquirem milhas nas suas contas pessoais dos programas de fidelidade já existentes das companhias. O programa posiciona os participantes em três diferentes categorias e permite mobilidade entre elas. No primeiro nível, cada dólar gasto na compra de bilhetes é convertido em um ponto.