Companhias áreas brasileiras poderão ser controladas pelo capital estrangeiro
As companhias aéreas do país poderão ser controladas por estrangeiros, caso seja mantido artigo incluído na Medida Provisória (MP) 652, que oferece subsídios para o desenvolvimento da aviação regional. O texto aprovado nessa terça-feira em uma comissão especial prevê a revogação do dispositivo do Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA) que determina que pelo menos 80% do capital votante das concessionárias estejam em mãos de investidores brasileiros. A MP ainda precisa ser aprovada pelos plenários da Câmara e do Senado, antes de ir à sanção da presidente Dilma Rousseff. A nova redação, elaborada pelo senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA), surpreendeu parlamentares do governo e da oposição.
O líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha (RJ), avaliou que os deputados podem rejeitar o item pelo simples fato de não ter havido discussão prévia na comissão especial. “Soube que as companhias áreas brasileiras poderão ser controladas pelo capital estrangeiro apenas durante a leitura do relatório. Fiquei surpreso”, ressaltou. A senadora Lídice da Mata (PSB-BA) mostrou preocupação com a medida. “Levarei essa discussão para a nossa bancada, mas não vejo com bons olhos a inclusão do artigo no texto”, comentou.
Flexa Ribeiro argumentou que restringir o investimento estrangeiro nas companhias aéreas limitaria as chances de capitalização e de entrada de novos competidores no mercado. E aposta no desenvolvimento da aviação regional a partir do fim dos limites ao capital externo. “Não estamos concedendo uma permissão para que empresas estrangeiras realizem operações de cabotagem em nosso país. O que se busca é incentivar que empresas se instalem no Brasil, pagando tributos e gerando empregos, sendo integralmente submetidas à legislação nacional”, detalhou. A Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear) informou que cada associada trata do tema individualmente.
PERSPECTIVAS
Para Olavo Henrique Furtado, coordenador de pós-graduação da Trevisan Escola de Negócios, a derrubada do limite ao investimento externo nas concessionárias locais de aviação civil, estabelecidas por uma lei de 1986, “ocorreria cedo ou tarde”. “O repetido discurso do governo, de que o transporte aéreo chegou às massas, precisa de uma sustentação no longo prazo. À medida que a demanda continua avançando, também cresce a pressão sobre a oferta de assentos via aquisição de novas aeronaves. E essa resposta exige, naturalmente, mais e melhores instrumentos financeiros”, resumiu o especialista.
Na avaliação do especialista Adyr da Silva, da Universidade de Brasília (UnB), já havia consenso geral de que a participação de estrangeiros em companhias aéreas poderia aumentar. Entretanto, alertou que as cotas de investidores de outros países em empresas do setor costumam ser pequenas e não devem aumentar muito no curto prazo. “Na aviação civil, as firmas têm dificuldades econômicas e o transporte aéreo é um setor com baixo retorno financeiro”, comentou. (Colaborou Sílvio Ribas)
Subsídio para rota regional
O protesto da Azul feito na véspera, com a ameaça de suspender encomendas à Embraer, levou o senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA), relator da Medida Provisória (MP) 652/2014, de apoio à aviação regional, a recuar. Antes de apresentar ontem o seu parecer sobre a MP na comissão especial, ele retirou a mudança que tinha feito no artigo do texto enviado pelo Executivo sobre o subsídio do governo às passagens em voos com origem ou destino em aeroportos regionais.
A companhia aérea considerava a alteração favorável às empresas que operam com aeronaves de maior porte. Sua reação levou as ações da fabricante brasileira de aviões despencar na segunda-feira, liderando as perdas na Bolsa de Valores de São Paulo (BM&FBovespa).
Após uma reunião no gabinete da liderança do governo no Senado, da qual participaram representantes dos ministérios da Fazenda, da Aviação Civil e parlamentares, se decidiu pela volta da subvenção para 50% dos assentos disponíveis em cada avião, mas limitada a até 60 passagens por voo. “Mantivemos na forma como o governo queria, sem favorecer a qualquer fabricante ou transportadora. Mas decidimos aumentar para 30% o percentual do uso do Fundo Nacional da Aviação Civil (Fnac) na subvenção aos bilhetes”, disse Ribeiro.
A previsão do Fnac para 2015 é de R$ 4,3 bilhões, sendo que parte desse valor será agora usado para subsidiar as rotas regionais. O relator defendeu, contudo, mudança na MP favorável à Amazônia, com a retirada do limite de metade dos assentos para a região, deixando a apenas 60 assentos. Depois de ameaçar anular o pedido de 30 novos jatos, a Azul informou em nota que acompanhará o trâmite do texto no Congresso Nacional até a sanção presidencial. Funcionários da companhia aérea acompanharam ontem de perto a votação da matéria e comemoraram a decisão dos parlamentares. (AT)
“Não há limite de assentos”
Brasília – O presidente da Embraer, Frederico Curado, minimizou a discussão em torno da Medida Provisória 652, que trata de aviação regional, e disse que ela não visa a beneficiar nenhuma empresa. A Azul ameaça deixar de comprar novos aviões da Embraer e suspender as encomendas dos jatos de segunda geração, se as mudanças feitas no plano de aviação regional forem aprovadas no Congresso Nacional.
Curado esclareceu que a Azul não é obrigada a comprar os aviões. “Nós assinamos com a Azul em julho uma ordem para 30 aviões. Estamos em fase de discussão contratual e a Azul não é obrigada a comprar aviões da Embraer. Acreditamos em mercado competitivo livre. É assim que Embraer atua e sobrevive pelo mundo”, disse. “Se houver a demanda no Brasil por aviões menores, em função de estímulo à aviação regional, estaremos brigando para vencer. Se não houver estímulo, continuaremos a vida normalmente”.
O presidente da Embraer afirmou que há um ponto de confusão no assunto e que a medida provisória não especifica limite de assentos. “Não há um número. O que tem ali é uma medida de incentivo à aviação regional”, disse. “O entendimento do governo, com o qual concordamos, é que a aviação é um elemento de desenvolvimento econômico também, além de social. O incentivo a aeroportos menores é incentivo à sociedade e não a empresas”. “A Embraer compete no mundo inteiro em aviação regional. No Brasil, também temos essa liderança através da Azul, que é a empresa que tem a rota mais ampla no Brasil, com características regionais”, afirmou Curado.
Ele reforçou que o incentivo à aviação regional beneficiaria a empresa, mas disse que a companhia não depende exclusivamente do mercado brasileiro. “Se há expansão da rede regional no Brasil, a expectativa é que empresas possam explorar esses mercados e, potencialmente, há demanda maior para Embraer”, disse.